o paraíso das compras na capital francesa.
Por Claudio Magnavita
Pelo emaranhado de ruas e galerias reinam compradores de varias partes do mundo. Os turistas ainda são minoria
Quando eu esbarrei no bairro retratado nesta reportagem, foi difícil esconder a surpresa.
Apesar de já ter pousado dezenas de vezes na capital francesa, de já ter subido outras tantas oportunidades ao topo da Torre Eiffel e de já ousar me arriscar sem mapinha pelo metrô, nunca tinha ouvido falar de Sentier. Descobri este pedaço da cidade quase por acaso. Fui visitar a sede da CVC em Paris, na Rue Clery, um simpático predinho de três andares. Fui recebido por Silvia Helena de Cerqueira, diretora da representação da operadora brasileira na França. Aceitei sua proposta de dar uma volta sem compromisso no quarteirão - todo mundo sabe que caminhar sem motivo por Paris é tiro certo.
Quando Silvia me disse que estávamos numa espécie de “Bom Retiro parisiense”, numa alusão ao famoso bairro dos judeus e dos coreanos paulistanos voltei ara buscar minha máquina fotográfica e meu bloquinho de anotações. Nem era preciso faro de repórter para perceber que uma grata surpresa estava diante dos meus olhos.
Entrando por um emaranhado de galerias repletas de lojas de prêt-à-porter, Silvia me levou direto à Place Caire, o centro desse paraíso das compras. Estava mergulhando em um dos segredos mais bem guardados de Paris.
O meu entusiasmo maior veio com a descoberta de que, desde a crise: econômica mundial, as lojas começaram a vender peças também no varejo - exceto às segundas feiras, dia reservado exclusivamente para os lojistas. Portanto, o caro leitor não deve se acanhar com; a mensagem na porta da maioria das loja.: “Não vendemos varejo”.
O atendimento a clientes que não buscam compras no atacado acontecem no final da tarde e não dá direito a provar as roupas. Os preços são inacreditavelmente baratos. Vestidos prêt-à-porter por 120 euros. Casaquinhos por 60 euros. Tudo por um terço do preço da Galeria Laffayette ou da pomposa Champs- Êlysées.
E não se trata de peças de ponta de estoque, mas de modelos que serão adquiridos como artigo de em várias grandes cidades do mundo por preços cinco vezes maior.
Turistas e comerciantes de várias partes do mundo, inclusive brasileiros, perambulam pelas charmosas galerias, para encherem as malas no Sentier. São centenas de lojas, sendo a maioria com confecção própria, nos andares superiores.
A principal concentração está na região da Place Du Caire. As vitrines falam por si. Comecei a fotografar...
...e fui abordado por um segurança. Fabricantes concorrentes franceses e donos de confecção de países como a China e Coreia costumam fotografar até com os celulares para copiarem os modelos dentro das últimas tendências. Por isso a proibição. Depois de um tour pela Rue Réaumur até a novíssima Montorgueil, retornamos pela famosa Rue Saint Denis, ponto remanescente de prostituição, com senhoras e balzaquianas ousadamente vestidas nas portas dos seus edifícios e à espera de clientes com tendência a síndrome de Édipo. É uma viagem no tempo, com personagens que poderiam ter pulado de um filme de Fellini ou das páginas dos romances de Gabriel García Márquez.
No avião de regresso ao Brasil, naquela mesma noite, o destino me colocou ao lado de uma passageira que é sinônimo de bom gosto e de moda.
Trata-se de Lenny Niemeyer, reconhecida pelas suas roupas de praia e dona de um atelier na rua São Clemente, no Rio. Ela voltava de um tour por Londres e Paris com uma agenda de moda. Falei do meu passeio pelo Sentier e lhe mostrei as fotos. Ela tomou um susto! “Nunca ninguém me falou sobre isso em Paris! Quero os endereços.” Mostrei as fotos na câmera digital e, diante da surpresa de Lenny, que conhece Paris como a palma da mão, tive a certeza que teria uma grande matéria para compartilhar com os leitores.
Ao chegar ao Brasil, comecei a telefonar e conversar com pessoas que julgo Ph.D. em Paris. Híldergard Angel, jornalista bem informada e que assina coluna diária no jornal do Brasil, disse: “Estive lá uma vez, levada pela Lucília Lopes, que sempre compra lá para a sua loja. Tem coisas incríveis”. Hilde se referia a uma das pessoas mais queridas da alta costura carioca.
O meu especialista preferido em Paris, ]anick Daudet, presidente do Club Med no Brasil, também soltou elogios. Ianick é francês de nascimento, apesar de ser o mais baiano-carioca que eu conheço. “Claudiô, o pessoal do Sentier é fantastique!!! Tenho vários amigos importantes la”, disse. Quando foi chef de village do Club Med no Marrocos, fez grandes amizades com os comerciantes do Sentier. “Eles sao sofisticados, lançam moda. Sabem viver e gostam de gastar e se divertir.” Depois deste aval de ]anick, eu não tive mais dúvidas.
Esta Paris diferente não poderia ficar longe dos viajantes mais experientes e que sabem os melhores endereços de tradicionais destinos. Aqueles que fogem das filas de turistas e do efeito manada dos landmarks.
Uma Visita ao Sentier deve começar pela Porta de Saint-Denis, o irmão gêmeo pouco conhecido do Arco do Triunfo, encravado na praça e engolido pelos prédios do Arco da Saint. Ao lado, está o restaurante Julíen, na Rue Faubourg Saint-Denis (acesso pelo metrô de Strabourg Saint-Denís). Todo decorado originalmente em art-nouveau, é uma Viagem aos anos 1920. O cardápio, com entrada, prato principal e sobremesa, não saí por mais de 30 euros por pessoa. O pato é o carro-chefe. A Rue Faubourg também é repleta de barracas de apetitosas frutas frescas. Mas a parte gastronômica do passeio pode esperar. Vamos às compras. Comece pela tradicional Passage du Caire, uma galeria simples, bifurcada, em um prédio em motivos egípcios que já serviu de cenário para filmes.
São dezenas de pequenas lojas com roupas de primeira linha. Apesar de ser uma galeria, coberta, a Passage du Caire pode ser encontrada nos mapas. Fica entre a Rue d'Aboukir, onde também existem muitas lojas de prêt-à,-porter feminina, e a tórrida Saint-Denis.
Tendo a Place du Caire como referência, as primeiras lojas que merecem menção são a F&M (Rue du Caire, 53) com vestidos de noite entre 80 e 200 euros. Possui vendedores atenciosos, trabalha há muito tempo com o mercado brasileiro e é mais flexível no atendimento à venda de varejo.
No mesmo bloco da rua, tente a Romeu pour Julieta, mais sofisticada e com uma aparência de loja de varejo. São roupas mais caras e sofisticadas, porém sempre com um preço que é um terço dos endereços mais badalados.
Na Rue d'Aboukir, chama a atenção o cruzamento, com roupas mais jovens, e a Jacques, no número 89, com acessórios, roupas casuais mais coloridas c bem ao gosto do clima tropical. A Olsy ocupa um prédio inteiro Vendendo belos Vestidos prêt-à-porter. Chegando a rua principal e mais conhecida do bairro, a Réamur, você encontrará lojas maiores e mais rígidas na venda ao cliente direto. Entre elas, a Renato Nucci e a YUKA, que buscam uma linha mais internacional.
Para dar um tempo nas compras, siga até a Rue des Petits Carreaux e a Rue Montorgueil. Ali funciona uma experiência-piloto do prefeito de Paris, Bertrand Delanoe, que transformou as ruas em uma grande avenida para pedestres, como um shopping a céu aberto.
O portal de entrada (no formato de um arco verde) desse calçadão começa na Petits Carreaux com a Rue Réamur. O comércio da rua ali foi desenvolvido com um mix bem pensado de lojas. Prepare o bolso e o apetite, que ficará aguçado na Fromageríe Rígattierí, no número 86, palco de uma deliciosa variedade de queijos artesanais dos quatro cantos da França. Um saboroso ponto para seu passeio pela Paris que só os franceses e uns poucos privilegiados conhecem.
Claudio Magnavita
Revista Proxima Viagem n°118